quarta-feira, 17 de fevereiro de 2010

O mundo é natural ou fantástico?

Isto é, o mundo é uma perpetuação natural ou uma marca do fantástico?

Em Julho de 1966, Ronald Christ realizou com Jorge Luis Borges uma extraordinária entrevista - digna da personalidade do escritor argentino -, que realça as suas imagens da vida perceptíveis neste excerto onde sobrevém a questão inicial:


Como é que define o fantástico, então?
Pergunto-me se podemos defini-lo. Julgo que é sobretudo uma intenção, num escritor. Lembro-me de uma observação muito profunda de Joseph Conrad - é um dos meus escritores preferidos - acho que na epígrafe de algo como The Dark Line, mas não é isso...

The Shadow Line [A Linha de Sombra]?
The Shadow Line. Nessa epígrafe ele dizia que algumas pessoas tinham pensado que a história era uma história fantástica por causa do fantasma do capitão que fazia parar o navio. Ele escreveu - e isto impressionou-me porque eu próprio escrevo história fantásticas - que escrever deliberadamente uma história fantástica não era sentir que o universo é, todo ele, fantástico e misterioso; nem que uma pessoa sentar-se a escrever algo deliberadamente fantástico significa falta de sensibilidade. Conrad pensava que sempre que se escreve sobre o mundo, mesmo que de um modo realista, se escreve uma história fantástica, porque o mundo em si mesmo é fantástico e insondável e misterioso.

Partilha desta convicção?
Sim. Acho que ele tinha razão. Falei com Bioy Casares que também escreve história fantásticas - histórias muito, muito boas - e ele disse: acho que Conrad tem razão; na verdade ninguém sabe se o mundo é realista ou fantástico, ou seja, se o mundo é um processo natural ou se é uma espécie de sonho, um sonho que nós podemos ou não partilhar com os outros.

Jorge Luis Borges, Entrevistas da Paris Review, Outubro de 2009

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